A comunidade do Mulungu, em Ipaporanga, acolheu um dos intercâmbios realizados dentro da programação da 15ª Feira da Agricultura Familiar e Economia Popular Solidária. Estiveram presentes 22 municípios do Brasil todo, desde Amazonas, passando por Rio Grande do Norte, Piauí, Sergipe, Bahia, até Mato Grosso, Minas Gerais, São Paulo e Paraná. A sensação dos e das participantes foi a de pisar um chão Semiárido de resistência, de fraternidade, de compromisso com a vida, de busca de Bem Viver, numa sintonia na luta vivida em todos os biomas desse Brasil eclético.

“Quero destacar a variedade de estados presentes, isso é importante porque nos ajuda a ver experiências diferentes” afirmou o Secretário de Educação de Ipaporanga Eder Pessoa, durante a excelente acolhida na escola António Lopes Teixeira. Música do Sertão, crianças vestindo a roupas típicas da região, muitas cores e muitas vozes em um só lugar. Após o café e as apresentações iniciais, as e os participantes se dividiram em quatro grupos. Dentro da temática “Convivência com o Semiárido” foram visitadas experiências de quintal produtivo, sistema Mandala e sistema Bioágua; e pelo tema “Defesa da vida, do território, cuidado com a casa comum” e “Reuso de Águas Cinzas” foi apresentado o Movimento em Defesa da Vida (MDV), da luta em defesa do Bem Viver e contra a mineração.

CONVIVÊNCIA COM O SEMIÁRIDO

Um dos grupos visitou o quintal produtivo de Francisca Martins Taveira e José Taveira Sobrinho no qual eles cultivam vários tipos de hortaliças agroecológicas, além do milho e do feijão, típicas plantações do Sertão. Depois de uma caminhada no quintal, todo mundo se juntou em uma roda de conversa para conversar sobre as técnicas agroecológicas e as técnicas de convivência com o Semiárido, tomando um caldo de cana preparado na hora.

Outro grupo visitou o quintal de Maria do Socorro Xavier dos Anjos que, apesar das dificuldades, continua com grande dedicação a produzir em harmonia com a natureza com o sistema da mandala. E na mesma linha de sustentabilidade plena, o Instituto Bem Viver (IBV) e o casal José Gualberto de Sousa e Maria Santos Vale apresentaram a outro grupo os benefícios do sistema de reuso das águas cinza “Bioágua”. “A coisa interessante é a transformação que uma tecnologia barata e simples pode possibilitar”, afirmou Mardones Bezerra, Presidente do IBV. Segundo ele, no terreno onde estavam antes tinha apenas pedras e agora tem goiaba, mamão e bananas.

“Fiquei impressionada, vou levar essa experiência de esperança para o quilombo, pra relembrar que somos nós da agricultura familiar que defendemos o meio ambiente porque temos coração, somos um povo corajoso, nós brasileiros”, afirmou Maria da Costa Barbosa, da comunidade quilombola de Abacatal, do Pará.           

RESISTÊNCIA À MINERAÇÃO

Outro grupo foi dialogar com o Movimento em Defesa da Vida (MDV) que desde o 2014 envolve crianças, jovens, adultos e idosos na construção de uma sociedade que visa a proteção socioambiental do território, fazendo frente contra a ameaça de instalação de uma mineradora de ferro na região. Uma realidade feita de resistência, mobilização e envolvimento das escola, das igrejas de diferentes denominações, de movimentos sociais, ONGs e das famílias da região que, apesar das dificuldades, continuam com grande dedicação a produzir em harmonia com a natureza, demonstrando que é possível gerar renda para todas aproveitando os recursos naturais de maneira sustentável, ao contrário da atividade que lutam para impedir, que geraria lucro e emprego para poucos e deixaria destruição permanente do meio ambiente.

O MDV é uma frente de resistência que busca impedir que se repitam crimes cometidos pela Vale no rompimento de barragens que destruíram o Rio Doce e Brumadinho e, como a trágica experiência da mineração em Quiterianópolis, que tem prejudicado a saúde dos moradores e poluído o Rio Poty. Dessa forma, luta para proteger os mais de 60 olhos d’água presentes nas serras onde se encontra o pretendido minério, evitando um geocídio sem precedentes para o Semiárido. Porém, quando a empresa ADLion começou as pesquisas, uma comunidade empoderada, que convenceu a prefeitura e a maioria dos fazendeiros da região a não caírem nas armadilhas sempre inventadas por esse tipo de empreendimento, como as promessas de progresso e emprego.

EDUCAÇÃO CONTEXTUALIZADA

Os quatro grupos retornaram para o almoço e partilharam o que viram, ouviram e sentiram. Em geral, houve relatos de que foram momentos de troca de ideias, de saberes, de conhecimento entre participantes de vários estados que têm em comum o cuidado com o meio ambiente e a valorização da educação. Todas as experiências compartilhadas no intercâmbio são frutos de um caminho que a comunidade está levando a frente junto as escolas no marco da proposta de Educação Contextualizada para convivência com o Semiárido que despertou no município de Ipaporanga a importância da agroecologia, do cuidado com a Mãe Terra. “Um dos resultados dessa interação é que o 50% da alimentação da merenda escolar é produzida nos quintais das famílias nas comunidades”, afirmou Aurineide Gomes Bezerra Lima, que atua pelo município como uma das referências do projeto Contexto: Educação, Gênero e Emancipação, realizado pela Cáritas Diocesana de Crateús, We  World, Pastoral do Menor, Esplar, Instituto Maria da Penha, ACACE, Escola Família Agrícola Dom Fragoso e é co-financiado pela União Europeia e We World.

Por: Lorenza Strano

Revisão: Eraldo Paulino

Fotos: Lorenza Strano